Uma tarde de quarta feira normal e tranquila como muitas outras que tive. Trabalhando e vendo o sol bater entre as folhas as arvores, formando aqueles raios de luz que adentram o ambiente. Como naquelas cavernas que por vezes ou outra vemos em fotos e vídeos, mas dificilmente pessoalmente. Uma comparação um tanto enfadonha já que estou imerso em um mar de verde e não em uma caverna. Pelo menos fisicamente. Meu interior estava sim numa caverna. Numa caverna que nem eu sei como entrei, mas estava lá. E esse feixe de luz advindo do topo de uma árvore que me trouxe a realidade um tanto perturbadora... eu estava em uma caverna interior.
(Foto tirada durante a realização de Ary, por MP Nuno dentro da Casa Monastica)
Observando a luz que vinha de longe esqueci do trabalho, esqueci do que fazia, esqueci da musica que ouvia. Simplesmente me desliguei daqui. Me desliguei daqui e fui sentar sob essa luz salvadora que enchia meus ouvidos um sonoro silencio.
Sentado com os olhos fechados sob a luz, passei a perceber o que ocorria a minha volta no mundo real. Observava as formas, as cores, os movimentos e observava os sons. Enquanto tentava sentir meus braços e meu arfante peito, nem dei conta de que meus pés já estavam em outra dimensão. Notando que meus pés não estavam mais aqui, acabei por parar de prestar atenção no resto do corpo e me desloquei para outro lugar de vez. Tentei pisar no chão, mas o chão não firmava. Já pisou numa piscina de fluido não-newtoniano? Então, e exatamente isso. Estava não mais sentado, mas a flutuar no todo como se nem mais pés eu tivesse. Com se nem pernas mais eu tivesse. E não tinha. Estava imerso em meio a um fluido denso o suficiente para me manter onde eu quisera, mas esparso suficiente para locomover-me sem atrito.
É... eu estava projetado. Não como já havia feito anteriormente em meio a meditação ou durante o sono, mas estava projetado de maneira consciente. Eu tinha consciência do meu ser físico e consciência de que minha própria consciência não estava no meu ser físico. É praticamente estar em dois lugares ao mesmo tempo. Mas dentro de uma realidade que compreende outras duas realidades, próximas uma da outra o suficiente para que elas sejam ‘confundíveis’ e inexistentes sem a outra.
Diferente do que imaginava, estar projetado nessa realidade ou plano nada tem a ver com outras projeções nessa realidade. Tem e não tem. É tudo igual. Mas é tudo diferente.
São as mesmas coisas, as mesmas formas e os padrões parecidos, mas essas coisas só podem ser presenciadas se senti-las de fato. Não adiantou-me querer ver. Mas bastou sentir.
Sentindo cada parte do chão, sentindo cada movimento do ar, sentindo cada força que dividia espaço com minha força, pude ficar ambientado em um paralelo onde eu sabia que fazia parte de todas as coisas e ainda assim era uma força singular. Só então consegui fazer minha percepção se movimentar. E ai que as coisas começam a se parecer apenas com um plano. As coisas se pareciam tanto com essa realidade como também se parecia com outra. Em mesmo tempo que um objeto está ali fisicamente, ele também está ali e em todo o resto. É como se as duas realidades paralelas se tornassem uma só. Uma terceira. E nessa que eu tive o prazer de navegar. E tudo tem a mesma cor. Ou melhor, as mesmas cores. Tudo tem um som que completa o próximo. E tudo fica equilibrado.
E não se espante de ver que entre o seu eu físico e o físico de outras pessoas, existem outras pessoas que não estão fisicamente ali, participando apenas de uma das realidades. Nem se o animal que viu no extrafísico saber que você esteve por ali. Eles realmente não separam as dimensões como nós.
Apenas para deixar um prolegomero futuro, será que nós seres encarnados somos realmente uma espécie a parte, que vive ao mesmo tempo nesses dois planos, mas só tomamos consciência de um ou outro por vez, como na hora que estamos acordados e dormindo? Será que essas realidades podem ser traduzidas como o nosso consciente e inconsciente? Ou será que o consciente e inconsciente é o mais próximo que consegui nesse momento para explanar a idéia de duas realidades distintas coexistindo ao mesmo tempo num mesmo lugar separados por uma estreita barreira das realidades?
De qualquer forma, um novo universo de percepções e sensações foi-me revelado hoje. Passei umas boas horas escalando as pedras para sair da minha caverna. E só depois de apoiar em cada uma delas e aprender com cada uma delas que vi esse novo mundo sendo parte do presente (novo mundo que deveria ser já tão conhecido).
Ah, mas apesar de passar tanto tempo nessa realidade e observando tantas coisas, tudo isso durou, nesse plano, uns 5 minutos. Sei que é um conceito maluco escrito por um maluco (e porque não dizer para uma pessoa maluca também), mas a transformação da experiência que passei não pode ser remida num livro, pois precisaria de uma enciclopédia apenas para explicar um trecho desse livro. Espero que tenha mergulhado nesse texto, adentrando mesmo que superficialmente nessa experiência e que ela possa lhe ser útil em algum momento.
Tenha uma ótima caminhada,
Ary Kemel
1/6/2011